Rubens Jardim

A poesia é uma necessidade concreta de todo ser humano.

Meu Diário
28/04/2010 11h34
O CAPITALISMO É A SEPULTURA DA HUMANIDADE!

A FAMÍLIA IDEAL É HOJE COMPOSTA DE UM SOLITÁRIO, UM ANIMAL DE ESTIMAÇÃO E UM COMPUTADOR PLUGADO NA INTERNET !

Sou bastante cético em relação ao chamado progresso. Podem me chamar de saudosista, retrógado –e até mesmo jurássico. Mas não consigo abrir mão da minha experiência de vivente. Por isso, como simples testemunha dessas últimas décadas, acho que nós caminhamos indeclinavelmente ladeira abaixo.  Tenho pena das gerações que nos sucederam e estão aí, enfrentando dificuldades inimagináveis para quem nasceu logo após o fim de guerra. Claro que existiram avanços em quase todos os setores do conhecimento, com destaque maior para  a ciência e a tecnologia. Na medicina, por exemplo, fazem-se próteses e retiram-se cataratas num piscar de olhos. O e-mail simplificou e acelerou a remessa e o recebimento de mensagens. A meteorologia consegue prever --nem sempre com exatidão-- algumas alterações climáticas. O celular nos coloca em sintonia com o mundo. Os jornais alteraram suas feições, tornaram-se coloridos e quase sempre mais padronizados e menos interessantes. O feminismo “libertou” a mulher dos afazeres domésticos. Os idosos conquistaram alguns direitos e até uma nomeclatura esdrúxula: (melhoridade).  O sexo não é mais tabu e as relações amorosas parecem ser mais livres. As vacinas nos protegem contra uma porção de doenças. Conquistamos maior longevidade. No entanto, a vida –a nossa vida única, pessoal e intransferível-- tornou-se mais despovoada de marcas significativas. E tenho opinião muito clara a respeito dessas questões. Acho que o desenvolvimento do capitalismo é que nos jogou nesse presente perpétuo, vazio e cheio de exigências, respostas rápidas e estímulos contínuos. Vejamos, por exemplo, as circunstâncias históricas que cercaram minha infância e adolescência. Papai era jornalista e funcionário público-- e mamãe nunca trabalhou fora. Meu tio Nicanor era professor e sua mulher nunca trabalhou fora. Mas as duas famílias viviam bem. Assim como outras tantas –de tios e primos muito próximos. Tínhamos boas escolas –públicas ou privadas—e tínhamos acesso a elas. Minha irmã e minha prima estudaram tanto no Sacre-Couer du Marie como em escola pública. Eu estudei no grupo escolar, e depois no Externato Meira, colégio frequentado pela elite da época. Todos os anos saíamos de férias –em julho – e em janeiro e fevereiro. E hoje, quem pode fazer isso? Homem trabalha, mulher trabalha, filho trabalha e são raras as férias familiares. Mais ainda: tínhamos uma convivência muito intensa entre a família nuclear e a grande família. Convivíamos com tios e tias, avós e primos e primas. Tudo isso também acabou. Como acabaram as visitas inesperadas, essas surpresas tão comuns exercitadas naquele tempo. E não estou falando do pós-guerra. Refiro-me aos estertores dos anos 50 e ao célebre decênio seguinte: os anos 60. Pois bem: como a televisão ainda estava pouco desenvolvida e não ocupava o centro de atenção das pessoas, as visitas tinham outra conotação. Elas possibilitavam trocas de informações, conversas mais pessoais e um certo enriquecimento afetivo e humano. Jamais as pessoas eram pautadas pela TV ou pela mídia impressa. As novelas – que até podem ter seu mérito—e os programas de baixaria e violência sequer existiam. Ou, se existiam, não ocupavam o imaginário e nem eram assuntos a ocupar a mente das pessoas. Outra questão importante: ninguém estava preocupado em manter o emprego. Essa inquietação não ocupava a vida de ninguém. Quer dizer: ninguém se sentia pressionado ou ameaçado. E não era mesmo preciso matar um leão por dia. Mais ainda: ao deixar o local de trabalho ninguém era importunado pelo chefe ou pelo patrão. Eu mesmo  comecei a trabalhar com 19 anos, isto é, em 1965, e só passei  a ser perturbado após o aparecimento do celular. A partir daí estamos, todos, sempre plugados e acessíveis. Enfim, vulneráveis e ligados. Não conseguimos mais desligar --nem o celular, nem a consciência. E carregamos isso em todas as nossas relações –até mesmo as amorosas e as sexuais. Aliás,a solidão, especialmente a sexual, está deixando de ser um problema, conforme excelente artigo da minha amiga Silvia Mendonça. Ao contrário, está sendo valorizada. Segundo a Silvia, pesquisa feita nos Estados Unidos mostra que a família ideal é hoje composta de um solitário, um animal de estimação e um computador multimídia, plugado na Internet.
Mais ainda--e segundo seu artigo--em torno desse núcleo gravita toda uma constelação de parentes-entre-parênteses: microondas e congelados, TV a cabo e DVD, celular, fax, livros (poucos), revistas (muitas), som, sauna doméstica, armas, aparelhos de ginástica, móveis inteligentes (há uma cama programada para colocar a pessoa de pé, suavemente, de manhã) e tudo o mais ao alcance de um sólido cartão de crédito.
O sexo interativo-não-virtual (leia-se a boa e velha relação sexual) vai se tornando uma curiosidade do passado. Só hippies embalsamados, índios e parte do proletariado ainda se entusiasmam com a idéia de praticar sexo. Entre os adolescentes também se nota algum interesse sexual, mas nada que um  bom par de patins on-line não resolva com facilidade.

É por essas e outras que já demonizei o capitalismo, como é possível ver na crítica visual acima. 
 


Publicado por Rubens Jardim em 28/04/2010 às 11h34

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