04/04/2016 01h21
AS MULHERES POETAS NA LITERATURA BRASILEIRA (74ª POSTAGEM)
JANDIRA ZANCHI(19 ) poeta curitibana, é ficcionista e educadora. Tem cursos de pós-graduação em astronomia e educação e é profissional de magistério. Trabalhou na Universidade Agostinho Neto, Luanda – Angola, entre 1985 a 1987. Como poeta publicou Gume de Gueixa (2013),. o livro virtual A Janela dos Ventos (2012) e Balão de Ensaio (2007). Participa do cosnselho editorial de mallarmargens, Revista de poesia e arte contemporânea. SISOS ...quase todos os instantes do dia ocupados em desfazer as pistas
das grandes vertigens dos alpendres de muitas fases dos minúsculos pormenores dialogados enfrentados na tábua rasa dessa empáfia oscilante e deslizante
comemorada em sisos e risos eloquentes disparados ao sol e ao sul — de mim..
SENHORA Foi na última noite. A primeira tempestade da madrugada Anunciava a chegada do alvorecer E todos os raios que partiram Em viagens ignoradas Voltarão em um clarão de lucidez.
Eu só me ria, só me ria correntes e grilhões desabando nem barreiras nem segredos como vivemos por tantos anos agrilhoados obstinados. Mas, tem a primeira madrugada.
Antes de adormecer grande despertar palavras e conceitos – não refaço não repiso não teorizo. Prática pré-praxis teoria depois sonho agora nessa madrugada.
castigos e fetiches coração eterno coração detive incansável que ronda teus passos
deve estar na poeira dos teus pés o segredo da minha paz.
17. OUTONO estamos erguidos em moreno quintal
jardim sem vícios ou virtudes por cem anos aspiraremos um ar de maribondos e metamorfoses
ondulando-nos entre as crases parágrafos como germens de cevadas ou frutos de outono.
UMBIGO fumava fumaças de charutos rútilos desejava desvios de prantos e pratas nádegas de defuntos
esquálida e vibrante essa face nódoa amante do umbigo
fertilizadora de silêncios.
CARLA ANDRADE(1977 ) poeta mineira, é jornalista e vive em Brasília há sete anos. Alguns de seus poemas foram premiados em concursos em Minas Gerais, São Paulo e Rio de Janeiro. Publicou três livros: Conjugação de Pingos de Chuva(2007) Artesanato de Perguntas(2013) e Voltagem (2014). EMBRIAGUEZ Acordei com gosto de ontem na boca. Vontade de ser um bálsamo. Procissão meus pensamentos, sem velas, no escuro, não há mãos dadas. Vão-se ideias em vão. Já vivi em livros Suprimi vertigens E não há mais vinho. Estou extinta há anos.
O MOTIVO DO SILENCIO Dendê, a palavra. É pimenta que anula. Gravata do sentimento. Para o amor, envergadura.
A palavra tem pele dura, sem âmago. É entranha de fagulha.
A palavra é bêbada, branca de desejo. Vândala armadura.
Prende em ecos o ar azul do dialeto, rouba mãos, grossas veias, esconde os dentes do afeto.
Invade a semântica do silêncio a metáfora dos amantes. Subverte o não nascido, transverte o que deve ser polpa. A palavra endireita o que é certo torto. Empobrece da alma o abismo.
Corpos nus não conjugam verbos na cama.
MARCADOR DE LIVRO Esta fita vermelha é como o fingimento dos seus quadris. Sempre fecho o livro quando não entendo o ritmo das letras.
As perguntas tão desinteressadas nas respostas.
Certos movimentos automatizados não me coram mais.
Mesmo assim, rápidas, lubrificantes de ponteiros são as minhas mãos, num seminário do desejo.
Na nudez do escuro, nada é tão impuro.
BARRA GRANDE Levei um ano para ver estrelas de novo. Olhei muito para cima nesse intervalo, mas elas se escondiam entre prédios com sobrenomes.
Tinha que voltar... colecionar as conchas que o mar não nos trouxe, como uma antologia de tudo que não se pode repetir.
ANA KEHL DE MORAES (1987) -poeta paulistana, fez curso de cinema na Universidade Federal Fluminense. Voltou pra São Paulo em 2010 e, no ano seguinte publicou seu livro de poemas NÃO FALO(2011). Atualmente se dedica à permacultura, música, comunicação não-violenta, meditação e outres aprendizados – além da poesia. 1. O mar: um fato, uma gota e já é mar.
Amor: um fato, uma gota e já é mar.
AMAR Matutando. Não sei o vento que me bate na cara. Se me levanta ou se me resiste, e não sei em que sentido: de cima pra baixo ou contra meu grito, não sei em qual abismo
estou voando.
7. João é um chão firme. Mas entre os grãos dessa terra se forma uma colmeia onde zumbem os voos, viagens, os muitos olhares de João.
Ele é um surto, e também nossa rotina. Abriga minha paixão, abriga minha guerra.
Força bruta crua, pensamento, braço – barba – uma risada, cara lunática. muita estrada.
João está onde eu vá. Por toda a minha pele.
CALEIDOSCÓPIO A presença é mais poderosa do que a simpatia, a fotografia - dizem as mulheres quêchua - dribla as almas, os cometas nos espelham, a saudade é um artifício dos deuses pra nos lembrar quantos mundos somos.
ALICE SANTANA (1988) poeta carioca, estreou com o livro Dobradura, em 2008. Lançou também as plaquetes Pra não ficar na gaveta e Bichinhos de luz, em tiragens limitadas. Seu livro Pingue-Pongue, em parceria com Armando Freitas Filho, foi lançado 2012. Seus poemas estão em várias antologias. Rabo de Baleia(2013) é seu último livro. há na esquina da rua um piano que toca notas esparsas em lá menor
nunca vi o rosto de quem se esconde por trás de acordes sustenidos
e que desfila dedos no teclado com a leveza de quem sustenta passarinhos no ar
COSTELAS DE ADÃO não serve de nada a janela a não ser para amparar do vidro do carro a estrada que escapa veloz e separar a montanha do céu noturno na linha que divide o escuro do ainda mais escuro você no banco um pouco mareado estar perto não quer dizer muito enquanto ainda não se chega lá olhar pela janela uma tontura a mesa que espera em casa firme em suas quatro pernas sustenta o vaso verde e nele duas costelas de adão as folhas estão prestes a irromper do vaso assim que a luz for acesa são fogos de artifício estourando na fotografia
UM ENORME RABO DE BALEIA cruzaria a sala nesse momento sem barulho algum o bicho afundaria nas tábuas corridas e sumiria sem que percebêssemos no sofá a falta de assunto o que eu queria mas não te conto era abraçar a baleia mergulhar com ela sinto um tédio pavoroso desses dias de água parada acumulando mosquito apesar da agitação dos dias da exaustão dos dias o corpo que chega exausto em casa com a mão esticada em busca de um copo d’água a urgência de seguir para uma terça ou quarta boia e a vontade é de abraçar um enorme rabo de baleia seguir com ela
AUSÊNCIA tenho te escrito com calma cartas em um caderno azul arranco da espiral e não posto por preguiça ou nem morta tenho medo da espera durante dias ou semanas um animal horrível (espécie de raposa) vai me perseguir por dentro, ou serei eu mesma (um rato?) a me roer enquanto a resposta não chega perco muito tempo tentando dar nomes aos bichos que sobem a cortina do quarto.
Publicado por Rubens Jardim em 04/04/2016 às 01h21
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