Rubens Jardim

A poesia é uma necessidade concreta de todo ser humano.

Meu Diário
20/01/2018 17h54
ENTREVISTA

O poeta e editor Jean Carlos Gomes Gomes entrevistou-me para sua coluna no OLHO VIVO. Abaixo segue a nossa conversa.

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“Descoberta, revelação, questionamento, ampliação do olhar e do pensamento; isso é o que a literatura de mais satisfatório me proporciona”

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Rubens Jardim, 71 anos, jornalista e poeta (um dos precursores de uma geração revolucionária do nosso cenário litero-cultural). Publicou poemas em várias antologias no Brasil e no exterior (Itália, Espanha e Portugal). É autor de três livros de poemas: “Ultimatum” (1966), “Espelho riscado” (1978) e “Cantares da paixão” (2008). Promoveu e organizou o Ano Jorge de Lima, em 1973, em comemoração aos 80 anos do nascimento do poeta e publicou “Jorge, 8O anos” - uma espécie de iniciação à parte menos conhecida e divulgada da obra do poeta alagoano. Integrou o movimento Catequese Poética, iniciado por Lindolf Bell em 1964, logo após o golpe militar. O lema era: “O lugar do poeta é onde possa inquietar. O lugar do poema são todos os lugares”. Participou da I Bienal Internacional de Poesia de Brasília (2008) com poemas visuais no Museu Nacional e na Biblioteca Nacional e da Mini Feira do Livro, com o lançamento de “Carta ao Homem do Sertão”, livro-homenagem ao centenário de Guimarães Rosa. Em abril de 2009, foi convidado a participar das comemorações dos 70 Anos da Guerra Civil Espanhola, evento realizado no Instituto Cervantes de São Paulo. Em 2011 passou a dedicar o seu blog exclusivamente à série “As Mulheres Poetas”... Até agora foram 100 postagens reunindo quatro poemas de quatro poetas. Portanto, já foram divulgados trabalhos de 400 poetas e mais de 1.600 poemas de poetas de várias gerações e de vários lugares do Brasil. 
No fim de 2012, uma seleta de seus poemas, “Fora da Estante”, foi publicada na “Coleção Poesia Viva”, do Centro Cultural São Paulo. Participou, em 2013, das homenagens realizadas na Câmara Municipal de São Paulo aos 25 de Abril português. Na ocasião, leu poema escrito especialmente para a celebração dos 39 anos da Revolução dos Cravos. Em maio de 2014, organizou e participou das comemorações dos 50 Anos da Catequese Poética, evento especial do Chama Poética, realizado na Casa das Rosas. Em julho deste ano, esteve em Belo Horizonte participando do programa do Museu Nacional de Poesia, de Regina Mello, Poesia no Parque. Em setembro de 2015 começou a fazer curadoria, em parceria com o poeta e ator Davi Kinski, do Sarau Gente de Palavra Paulistano, realizado mensalmente no Sebo Aliança e depois na Patuscada, Livraria e Café. Em 2016 criou, com vários amigos, o Sarau da Paulista que acontece no último domingo do mês na Paulista esquina com Peixoto Gomide. O Sarau da Paulista é um movimento que reúne poetas de várias gerações. É absolutamente democrático e aberto a todos os que se interessam por arte e cultura. 

Confira a entrevista com Rubens Jardim 

Diante da crescente relevância das mídias digitais, que novo cenário se desenha para a literatura brasileira? 

Não há como negar: o avanço das tecnologias altera nosso comportamento e, consequentemente, transforma aspectos estruturais da realidade social. Não é preciso ir muito longe para deixar isso muito claro. McLuhan já alertava, nos anos 60, como os meios de comunicação de massa afetam profundamente a vida física e mental do ser humano. Saímos do mundo linear, tipográfico, mecânico, para o mundo audiotáctil, tribalizado ecósmico da era eletrônica. Atravessei essas mudanças, mais marcantes e claras, nas redações e oficinas de jornais. Ali pude constatar que o avanço tecnológico caminha em direção ao desemprego. Presenciei isso em vários jornais e revistas onde trabalhei. As funções de linotipista, de past-up, de revisor, por exemplo, desapareceram. Existem aspectos positivos nisso? Sinceramente, não sei.É um troço que me assusta. Mas em tudo que fazemos existem os lados bons e maus. Quanto ao novo cenário para a literatura, entendo que atualmente é muito mais fácil a produção de um livro. Qualquer pessoa pode fazer um livro digital, divulgá-lo e comercializá-lo. Eu, por exemplo, possuo um blog-site pendurado no portal Recanto de Letras. Curiosamente, já me deparei com números assustadores: mais de 2 milhões de poemas! E sem contar acrósticos, sonetos, haicais, prosa poética. Claro que a qualidade de tudo isso é, no mínimo, duvidosa...

A constante crítica de que somos um país de poucos leitores interfere de alguma forma em sua atividade?

Interfere, é claro. E pra quem escreve poemas isso é cruel. Se você consegue publicar através de uma editora média ou grande, de renome, teu livro será distribuído pelas grandes e poucas livrarias existentes no Brasil. Mas ficará, via de regra, em estantes de difícil acesso, com pouca visibilidade e quase que escondidas. E oferecendo sempre poucas alternativas. Até porque, para o bem ou para o mal, a poesia resiste em transformar-se em mercadoria. O bordão de que “poesia não vende” que vive na boca dos editores parece verdadeiro. Exemplifico com a publicação de meu último livro de poemas, “Cantares da paixão”, 2008. Dois grandes nomes fizeram prefácio e apresentação: Claudio Willer e Affonso Romano de Sant´Anna. E ainda assim, depois de mais 40 anos de atividade poética, fui publicado por uma editora média-pequena. E isso faz com que a circulação do livro fique muito restrita. O que significa que você será lido por muito pouca gente. Mas independente disso confesso que “meu verso é minha cachaça” como já disse Drummond. E continuo ainda muito ativo e presente em um grande número de saraus realizados em São Paulo. Sou curador, junto do Davi Kinski, de Gente de Palavra Paulistano, que já completou dois anos. E idealizei o Sarau da Paulista que acontece no último domingo do mês, há mais de um ano, no calçadão daquela avenida. 

O que a literatura de mais satisfatório lhe proporciona?

Descoberta, revelação, questionamento, ampliação do olhar e do pensamento. Sempre fui, desde a adolescência, um leitor voraz. Claro que isso tem muito a ver com o ambiente familiar em que nasci. Costumo dizer que nascer em classe média no Brasil confere uma série infindável de privilégios. O gosto pela leitura é apenas um deles. E é óbvio que em uma casa de jornalista - essa era a profissão de meu pai - não iriam faltar livros, jornais, revistas, e o hábito de leitura. Se você não tiver isso em casa, dificilmente se tornará um leitor, uma pessoa que sente prazer no ato de ler. E convenhamos: sem prazer tudo se torna mais difícil e complicado. Felizmente, muitos poetas e escritores batalham no sentido de democratizar a literatura. Hoje, existem mais de 100 saraus mensais de poesia e música na grande São Paulo. Tenho participado de muitos e tenho a honra de ter feito parte de um dos movimentos pioneiros dessa reaproximação do poeta com o povo: a Catequese Poética, iniciada em 1964, por Lindolf Bell, logo após o golpe militar de 64. 

Qual é a função da literatura na sociedade?

Gosto muito dessa frase atribuída ao romano Caio Graco: “Os livros não mudam o mundo. Quem muda o mundo são as pessoas. Mas os livros mudam as pessoas”. Acho que esse pensamento sintetiza, com brilho e economia verbal, a dimensão da transformadora da literatura. E digo mais: se existe alguma coisa que funciona como antídoto ao adestramento da sociedade de massas, ao fascínio visual-auditivo da TV e da internet, e a grande festa do consumo que agita a vida social atual, essa alguma coisa é a literatura. E por uma razão muito simples: a literatura não tem valor mercadológico. A literatura não é um meio: ela é sempre um fim em si mesma. Não existe em função de coisa alguma a não ser ela mesma e a alegria que faz nascer. Qualquer livro é uma porta aberta para o mundo.

O que acha da iniciativa de entrevistar/homenagear renomes de nossa literatura? Fazendo além de uma justa homenagem um fomento entre o autor consagrado e o autor iniciante... 

Embora não me considere um poeta de renome, apesar de já ter completado 50 anos de atividade nessa área, procuro apoiar e divulgar todas as iniciativas de ampliação e capilarização de contato com possíveis leitores e outros escritores. Nessa direção, estou concluindo a série “As Mulheres Poetas”... Foram 101 postagens feitas em diversos espaços das redes sociais. Já foram contempladas mais de 400 poetas de vários estados e várias épocas e mais de 1.600 poemas. Pretendo, agora, fazer livros digitais dessa série e, mais adiante, buscar uma grande editora para transformar em livro essa pesquisa que durou seis anos.


Publicado por Rubens Jardim em 20/01/2018 às 17h54
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