Rubens Jardim

A poesia é uma necessidade concreta de todo ser humano.

Meu Diário
16/06/2013 18h35
AS MULHERES POETAS NA LITERATURA BRASILEIRA (34º post)

MARIA LUISA RIBEIRO (1954) poeta goiana, é advogada, possui licenciatura plena em letras e português.Faz parte da Academia Goianiense de Letras e da UBE, Goiás. Já publicou romances, contos e literatura infantil. Em poesia publicou O Tempo Responde(1988), Além do Alambrado(1990),O Pássaro de Bico de Ferro(2009) e Mergulho nos Poros.

 


 

 

 


MERGULHO NOS POROS

 

 


Aos poucos tu mergulhas 

 

 


no fundo dos meus poros

 

 


na vã filosofia 

 

 


que esconde os meus anseios

 

 


e no pico da neblina

 

 


que assusta os meus cabelos.

 

 


Sem pressa e com presteza 

 

 


descobres meus atalhos

 

 


te mostras tão inteiro

 

 


que inibe os meus retalhos

 

 


me prendes nos teus olhos

 

 


e sossegas  minhas dores.

 

 


 

 

 


É quando a flor da pele 

 

 


se implanta no meu solo

 

 


e espalha um novo cheiro

 

 


na  cava da rotina.

 

 


E a chuva cor de rosa

 

 


te entrega a mesma história

 

 


por trás das fontes

 

 


depois das mortes

 

 


além dos montes.

 

 


 

 

 


COLUNA DE PERNAS

 

 


Ao revés

 

 


da maioria de nós 

 

 


são-me raras 

 

 


as enxaquecas

 

 


e nunca cataloguei

 

 


tensões pré-menstrual.

 

 


Mas desde que nasci

 

 


carrego penas na coluna

 

 


porque meu coração

 

 


é a coluna do meu eixo.

 

 


E quando ele se dobra

 

 


ao peso das arestas,

 

 


incita-me ao diálogo

 

 


com minhas febres íntimas

 

 


que em reprise

 

 


pisam o meu chão fatigado

 

 


de promessas.

 

 


É esta dor sem nome

 

 


as penas que em mim 

 

 


habitam

 

 


e o meu texto sentido

 

 


habilitam.

 

 


 

 

 


MÁSCARAS 

 

 


 

 

 


Enquanto caía o pano

 

 


o  espelho  refletia

 

 


a minha nova solidão:

 

 


findava-se a hora de ângelus.

 

 


Agora eu era só

 

 


um tronco sem raízes

 

 


sustentando um galho seco

 

 


florado  na primavera.

 

 


Sobrevivo

 

 


com  a  sentença do teu nome

 

 


ecoando  no meu peito

 

 


e continuo  amando-te  além de mim.

 

 


E  nesta parede, o espaço do poema

 

 


reservei  às  nossas máscaras Top line.

 

 


 

 

 


SILHUETA DOS DÉDALOS

 

 


 

 

 


Na intensidade que cabe a cada coisa

 

 


presume-se  um quarto de espelhos

 

 


onde  cada  lado  reflete  muitas faces.

 

 


Ainda não foi possível entender 

 

 


a silhueta dos  dédalos   

 

 


que permanecem 

 

 


na alquimia  dos homens

 

 


enquanto  os espelhos se propagam

 

 


Assim, cada  circunstância   é uma esquina

 

 


onde  os minutos fogem 

 

 


pelos vãos do dedos

 

 


e a vida pulsa  no conta-gotas das horas.

 

 


Permaneço na galeria dos anônimos

 

 


enquanto  redescubro  o segredo

 

 


dos instantes multifacetados.

 

 


 

 

 


REGINA DAYEH (1954), poeta carioca, passou a infância e adolescência em Santos. Mudou-se para São Paulo, onde se formou em Direito no Largo de  São Francisco, em 1977. Foi professora universitária de Direito Empresarial e é atualmente Assessora Jurídica do TRT-SP. Publicou apenas um livro de poemas :Meu Pai Desenhava Navios, lançado no mês de maio deste ano.

 

 


 

 

 


POLTRONA

 

 


Quando me sinto cansada

 

 


não tenho urgência nas palavras.

 

 


 

 

 


respiração pausada,

 

 


engulo a lágrima

 

 


preguiçosa

 

 


a fumaça tragada

 

 


encontra a fadiga em mim.

 

 


 

 

 


Afinal qual a resposta para o cansaço?

 

 


minha poltrona recebe

 

 


o corpo jogado

 

 


balanço balanço

 

 


barulho leve

 

 


da mola enferrujada

 

 


embala embala

 

 


embaralha imagens

 

 


inúteis

 

 


largadas pelo caminho.

 

 


 

 

 


Minha poltrona é o colo que  tenho

 

 


embala embala...

 

 


 

 

 


Quando me sinto cansada

 

 


não vejo sentimentos

 

 


só meus pés inchados

 

 


de realidade.

 

 


 

 

 


FATO

 

 


Acabou de desabar um edifício dentro da minha cabeça.

 

 


 

 

 


Pela vias laterais do monumento

 

 


chega poeira

 

 


entulho

 

 


devasta defuma

 

 


a rua sem saída.

 

 


 

 

 


o fio solar mira na minha retina

 

 


rompe o escuro

 

 


desenha 

 

 


reta 

 

 


a linha.

 

 


 

 

 


A vida continua

 

 


dizem os que passam.

 

 


Ante o imponderável

 

 


eu concordo

 

 


e respiro

 

 


e faço planos

 

 


para ocupar os espaços

 

 


abertos pelo esquecimento.

 

 


 

 

 


VIAGEM I

 

 


para Fernando Pessoa, Lisboa, junho de 2009

 

 


 

 

 


Cada viagem solitária tem seus encantos e seus infernos.

 

 


 

 

 


Naquelas eu queria ganhar o mundo,

 

 


quanta pretensão...

 

 


 

 

 


Nesta eu quero ganhar o meu mundo,

 

 


ganhar-me de volta,

 

 


quanta pretensão...

 

 


 

 

 


Parte de mim eu perdi em viagens sem volta

 

 


enroscada em cipós

 

 


encalhada em bancos de areia

 

 


embicada em barrancos.

 

 


 

 

 


Não há resgate.

 

 


 

 

 


Que parte de mim

 

 


hoje vive sem mim?

 

 


Que parte de mim

 

 


se restaura a cada passo?

 

 


 

 

 


A cada viagem no tempo

 

 


deixo vazio o espaço que sobrou entre nós

 

 


que se acomoda

 

 


sem conforto

 

 


no pouco experimentado.

 

 


 

 

 


Novas viagens

 

 


outros portos

 

 


janelas abertas.

 

 


 

 

 


E a areia fria e lavada de cada manhã sob meus pés.

 

 


                                                                                                                                                                                                                         

 

 


PACÍFICO

 

 


San Francsico, janeiro, 2012.

 

 


Esse mar

 

 


se apropria

 

 


do meu fundo

 

 


se encapela

 

 


no meu raso

 

 


esse mar

 

 


respinga sal

 

 


sobressalta

 

 


em mar pesado

 

 


pacífico

 

 


acinzentado

 

 


não é mar de azeite

 

 


espuma raiva

 

 


ensandece

 

 


e encontra a pedra

 

 


inutilmente.

 

 


 

 

 


LILA MAIA (1955) – poeta maranhense, pedagoga, vive no Rio há 32 anos Tem dois livros de poesia publicados: A idade das águas e Céu Despido. Em 1998, teve três poemas publicados na Revisa Poesia Sempre, da Biblioteca Nacional e conquistou, no ano passado, o prêmio Paraná de Poesia, com o livro As maçãs de antes.

 

 


 

 

 


Quando o insuportável começa a virar maré cheia,

 

 


me pergunto:

 

 


por que não me tornei alpinista de empresa

 

 


escalando os prédios mais altos da Avenida Rio Branco?

 

 


Quatro anos de Letras,

 

 


mais dois de Pós em Literatura Portuguesa, 

 

 


o curso completo de inglês no IBEU, 

 

 


não permitem que a mesa do café seja invadida 

 

 


de iogurtes, queijo branco, uvas, kiwi, pêssegos, 

 

 


mamão com mel.

 

 


 

 

 


Por que não me especializei em alturas?

 

 


Uma estrofe de cor dos Lusíadas,

 

 


não é suficiente para o trabalho de Call Center

 

 


na empresa Silva Lins.

 

 


Era preciso ter um diferencial na voz. 

 

 


Mas eu disse um verso de Camões.

 

 


 

 

 


E a menina ao meu lado, 

 

 


estudante de Propaganda e Marketing na Estácio,

 

 


saia justa, corpo bronzeado de Ipanema, 

 

 


um quê de rouquidão forçado no final das frases,

 

 


sai com carteira assinada e setecentos reais por mês. 

 

 


 

 

 


AQUELA PERDIDA LUA DE COPACABANA

 

 


 

 

 


Amores não correspondidos são balas perdidas

 

 


em plena Avenida nossa senhora de Copacabana.

 

 


 

 

 


Não ouvem a musicalidade lógica das ondas

 

 


para calar o bêbado soluço,

 

 


a sina de carregar o corpo deserto.

 

 


 

 

 


Tudo é avesso, naufrágio, solidão velha

 

 


neste calçadão bordado de prostitutas, pivetes.

 

 


 

 

 


Amores não correspondidos nunca se apossam

 

 


das tardes lentas no Caminho do Pescador.

 

 


 

 

 


A rede que devia partilhar a carne,

 

 


recolhe homens, mulheres que têm no peito

 

 


não um rio amparado por estrelas,

 

 


mas uma Bagdá de abandonos.

 

 


Quarto alugado

 

 


 

 

 


Tudo tem a dureza de muitos degraus.

 

 


Um esgrimir que corta aquele feeling

 

 


de perceber encantamentos.

 

 


Até a cama não comporta o meu desejo par.

 

 


É ímpar a saudade dos livros espalhados na mesa.

 

 


Hoje, Clarice e Drummond continuam na mala.

 

 


 

 

 


E aquela voz que lapidava

 

 


escuridão e chama,

 

 


quando eu tinha o direito de dar

 

 


nomes ao silêncio, 

 

 


agora vive como se estivesse

 

 


olhando a presa.

 

 


 

 

 


QUASE LAMENTO

 

 


 

 

 


Desses sonhos mais simples Deus não sabe

 

 


Nunca sentirá o prazer de ter livros na estante

 

 


e da falta que fazem uma mesa, quatro cadeiras,

 

 


um colchão de casal

 

 


Ele não compreende aquela janela inquieta,

 

 


as paisagens que transbordam livres

 

 


 

 

 


Deus é o que há de mais interminável em mim: a dor

 

 


Mas eu bebo do cálice

 

 


como do pão

 

 


às vezes ofereço a outra face por amor

 

 


 

 

 


O tempo segue com seu fogo milenar

 

 


Eu passo o pente nos cabelos sobriamente

 

 


Sobrevivo diante dos mistérios,

 

 


e desta claridade que não salva

 

 
O OLHAR MADURO DA ONÇA

Não se escreve um poema de amor impunemente.

No desvão da noite uma onça perpetua a sombra de fogo
sobre teu caminhar espaçado.
Há uma súplica com os devidos ais prudentes,
a onça sabe onde derrama seus passos.
Crava os dentes nesta carne que tem cheiro de batismo,
o sangue suado da caça.
Que rara luz expressa teu corpo.
A onça é aos poucos domesticável.

Não se escreve um poema de amor impunemente.

 
CÉLIA MUSILLI  (195 ) poeta paranaense, é jornalista, cronista e . Autora de Sensível Desafio (2006) e Todas as Mulheres em Mim ( 2010), faz Mestrado em Literatura na Unicamp e tem sonhos premonitórios. Gosta de livros, viagens, estrelas e gatos, nem sempre nesta ordem 
 
 
PRAZER
 
ainda que 
o que me instigue o corpo 
seja breve 
seja novo 
será sempre 
a lição sem fim 
de redescobrir paraísos 
perdidos 
dentro de mim
 
SABEDORIA QUASE CHINESA
 
se alguém não te alimenta
inventa
uma manhã de sol
fruta fresca
chá de hortelã
para despertar a alma
com calma
que o dia apenas começa
e o amor não combina com pressa
 
ROSA ÍGNEA
 
Abro e deixo
ao seu prazer de homem
a rosa
ígnea rosa
 
abro e deixo
ao seu prazer de fogo
líquen e caule
de novo
 
a conjunção da carne
entre as minhas pétalas
e as suas veias
paisagem em meu corpo
mergulho em seu mar
sereia 
 
DELICADEZAS DOEM
 
porque há canções de chegada
canções de partida
o coração eu tomo pela mão
quebrável
 
no último beijo
transversal de línguas
poliglota
falo de amor 
delicadezas doem
 
não sei se já disseram
mas você sabe matar pássaros
 
TODAS AS MULHERES EM MIM
 
a cada vez que ele volta
abro meus braços de rio
serpente do Nilo
Alice no espelho
estrela cadente
gata no cio
sereia de Ulisses
Penélope nua
queria tanto ser sua
 

 


 

 


Publicado por Rubens Jardim em 16/06/2013 às 18h35

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