24/01/2017 23h38
AS MULHERES POETAS NA LITERATURA BRASILEIRA (86ª POSTAGEM)
ELISANGELA BRAGHINI (1972) poeta paranaense, nascida em Brasilândia do Sul, é formada em direito e advoga há mais de 20 anos. Já morou em Ariquemes (Rondônia),Maringá, Curitiba e atualmente vive em João Pessoa. Fez pós-graduação na ESMAT 13, Escola Superior da Magistratura Trabalhista da Paraíba. DESPEJO Dissipo-me dos trajes que ontem usei no circo Meu humor mudou-se com eles
fora de mim não minto nem faço rir enxergo a nudez apática que soa sátira mas é dor
Limpando a falsa lágrima maquiadamente escrevo livro-me em público - entre as capas entre aspas que não me contém
andando leio o livro com outra face
enquanto aguardo - absolvo-me no cálice e não calo - o poeta livre andar errante educadamente a arder-me os olhos queimar-me a pele cremar-me a carne incinerar-me os ossos a pó
calcificar-me em lava ou lavrar-me após a chuva ácida as páginas em branco
LAPIDANDO Esse homem virgem às vezes me sorri em verso Devorando-me em vertigem
No novo universo em voo liberto como sempre quis sussurro em meu canto!
Em tudo o que diz Mina raro o amor em inesgotável fonte um lapidado diamante...
Ele, intransigente Intransitivo Indireto verbo de um tempo que não existe: Deixa passar! Deixa pra depois! Espera o olhar por nós dois...
PORTA-RETRATO Ao amor não assiste perguntas ou respostas
de joelhos agradeço mendigo palavras que auroram poesia
engasga-se revelando-me o futuro seu silêncio místico...
linguagem de sinais copio incompreendido nas mensagens o socorro garrafas lançadas ao mar naves sem rumo
em desconhecidas órbitas sigo (estrelas que não existem)
enquanto a ampulheta traga o deserto de rosas
na praia o milagre do tempo espero sem medo revolto o mar navego
repousa tranquilo em meu colo autorretrato vitrificado o desejo explícito seu olhar salgado
COMBATES Travo guerras amorfas não sangram jornais antes rasgam palavras
silenciadas distantes telas bloqueio - as pálpebras no cristal
óleo de peroba derrete-se nas caras de pau nas peles - arranco dos cordeiros que uivam - verão aquecem meu inverno
Crio nos amores que invento belos/deliciosos/sevados os sirvo à ceia que sacia
digiro-os enquanto sonho à aurora descarto-os na descarga
doida raiz aprisiona-me refém do silêncio abusa-me! JULIANNA MOTTER (19 ) poeta brasiliense, é jornalista e estudante de filosofia. Colabora com os sites Entre-Vistas, Homo Literatus e também participa do coletivo de poetas Ex-estranhos. Mantém desde 2007, o blog http://comascartasnamesa.blogspot.com. Publicou o livro de poemas De carne e concreto (20 ). 3 Foi bom e foi lindo desejei eterno foi suave então pesou e revelou-se findo. Finalmente, te esqueci. Antes tarde do que nunca. O precisar esquecer é um relembrar constante. Mas se antes arde, depois nunca 17 fica um borrão uma lembrança os resquícios uma fotografia desfeita em pó de um gosto bom fica a caneca a xícara o copo que seja um objeto ainda quente como um espaço uns lençóis suados na cama o cheiro nos lábios entre os dentes pintado na língua na ponta dos dedos a presença feita ausência de um amor requentado que nem café
POESIA URBANA te reconheço na rua te recomeço na cama A CURA DURA DURARÁ ser presença onde a ausência te emudeceu
abraço apertado na noite fria abraço calado na cama vazia
silêncio e pó
silêncio e só
juntos justos tão apertados que é preciso prender o ar para caber que é preciso ficar sem ar para soltar
ser colo ser céu e ser seu
ser chão onde os pés lhe faltarão
a cura dura durará
a carne fraca nos sustentará CARINA CARVALHO(1989) poeta paulistana, participou da antologia poética É que os hussardos chegam hoje (2014) Seus textos estão em algumas revistas digitais . Publicou seu primeiro livro de poemas Marambaia em 2013 e foi uma das selecionadas na categoria de poesia do II Prêmio Ufes de Literatura (Edufes, 2014) O PORO A PELE antigo afeto que lhe ofereça toques moles, comedimento nas conversas, um afago cru . mas não, jamais quis morar em peito tão vago e sem janelas abertas fazer barulho raspando o fundo levar do doce o que lhe é mais íntimo; degustá-lo nu DO ESPANTO esquecer conceitos num branco total: do que falas é o que menos escuto só me fixo em ignorância e sorrio, sorrio
[havia uma canoa de carcaça gasta à margem, um cão cinzento ao lado de sua base e vários mosquitinhos fazendo dança acima do focinho pintado. ele farejava o camarão, mas os grandes olhos mantinham-se vidrados na ronda de insetos pairando]
os grandes olhos... os teus são miúdos, tão escuros
espantada percebo que perdi o discurso e te sorrio de novo para prosseguir caçando pérolas aos poucos ........................................................................ diz o musgo: nunca, nunca se arrisque em trilhas isso de cutucar vespeiros vai empolar tua vida na volta
ir falando (muito eloquente) de litorais, espantar moscas com as braçadas mais notáveis e cuidar para não chorar baixinho a ardência da pele quando cair a noite
um minuto que fraquejei e me botaram num escafandro sem espaço pros braços QUE PERMEIA UM CASULO a casa é que estala tardes longas de azul pálido na mudez do corpo estendidas – as tardes – num varal que zumbe, por exemplo, o som vago da carne, desse pouco que é o corpo. que é o corpo? . outro dia uma movimentação tão fluida escorria (não estalava nem estendia), escorria uma movimentação tão fluida outro dia, que, meu amor, o sentido de tanta moradia não escapou por pouco KAREN DEBÉRTOLIS (19 ) poeta paranaense, escritora, jornalista e performer. Gravou o cd de poesia “A Mulher das palavras” (2009) que deu origem a um espetáculo que tem circulado desde 2009 por vários espaços púbicos. Publicou: Guardados(2003) A Estalagem das Almas (2006) e Prosa de Palavras (2012). a falsidade causa transtornos indesejáveis a falsidade causa acidez no estômago a falsidade causa um rombo na alma a falsidade causa calafrios de assombro a falsidade é desonesta a falsidade é a antítese do amor a falsidade é muito mais que o ódio a falsidade, cheia de empáfia, vaga pelas ruas a falsidade, arrogante, abarrota os auditórios a falsidade, ignorante, disfarça-se com seu pince-nez a falsidade, amável e sedutora, deita-se ao seu lado a falsidade, chama pelo seu nome e dorme o sono dos justos DESAPARECIDO sou o seu duplo o invisível nos escombros do self a sombra por detrás dos espelhos o desapercebido que passa como um vulto uma sensação apenas um frio na espinha
silenciosamente
esgueira-se pelas beiradas confunde-se com os restos de papelão em frente às lojas de departamento recosta-se nas colunas das marquises com medo e frio e observa o mundo com a lucidez da realidade
solitariamente
ALICE E O ESPELHO Ontem de manhã quebrei o espelho e Alice foi embora pelo vão da árvore como não era de costume e antes que sem Alice eu me acostume disse hoje de manhã não compro outro espelho
TRATADO SOBRE O SILÊNCIO O silêncio dói muito mais na pele do inimigo que o grito. Pousa, assim, cálido, como uma resposta sem pontuação. Deita suave nas concavidades do ouvido. Desconserta. Hospeda pulgas atrás da orelha. Arma afiada Toque lancinante Estratégia zen Linguagem dos deuses da arte da guerra Publicado por Rubens Jardim em 24/01/2017 às 23h38
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